A virada

Léo Ferlauto

Ali estava desde sempre. Lugar confortável, tranqüilo. Sensação de nadar em águas tépidas, confusão e frio deixados fora. Escutava as batidas do coração saboreando o ritmo primal. Haveria som mais delicioso?De quando em quando escutava suaves canções vindas de algum lugar ali por perto provendo sensação de calma. Noutras ocasiões, vozes familiares inspirando ternuras. Dormia quando tinha sono. Sonhava belezas. Se alimentava sem dar chance à fome. Tudo arranjado de maneira harmônica, orgânica, simples. Espaço paradisíaco. Dificil acreditar haver mundo melhor.

Havia, claro, dias de alvoroço que repercutiam por ali. Vinham de fora e apenas aguçavam curiosidades, sem mais. Estava num lugar seguro.

Mas chegou aquele dia. Desde cedo a rotina modificou, divergiu. Aquela paz que parecia eterna, num repente sumiu. Pressas, movimentos inusitados, conversas ininteligíveis, vozes familiares e outras não. Gemidos? Rumores próximos, longínquos, um ar de ansiedade se insinuando, nervosismos desconhecidos.

Logo sentiu-se como peixe fora d’água, e assustado gritou o mais estridente que pode, protestando contra aquela desordem violenta. O paraíso espatifado. Depois daquele dia, nunca mais foi o mesmo. Uma luminosidade intensa feriu seus olhos, seus ouvidos percebiam estrondos. Nascera, finalmente, para um mundo que ele jamais imaginara existir.

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