Ângelo

Vitória Leiria

Ângelo, filho de uma costureira, Clara, e de um torneiro mecânico, Pedro, crescera em meio às linhas e agulhas.

Quando Ângelo completou sete anos seu pai, com certa desconfiança e receio quanto ao futuro do filho, passou a ensinar-lhe o seu ofício levando-o todos os dias para a oficina depois da escola.

Na escola, Ângelo, aparentemente, demonstrava ser um aluno normal, taciturno, retraído. Porém um dia ele desentendeu-se com um colega que o chamara de “bicha”. Nesse dia seu pai foi chamado à Escola e foi então que ele começou a desconfiar que algo não ia bem com Ângelo.

- A irmã Sofia irá atendê-lo num instante. Disse irmã Teresa.

- Sr. Pedro, por favor, entre!

- Irmã, o que aconteceu?

- Seu filho brigou com um de seus colegas de turma. Foi preciso duas pessoas para separar os dois. O Ângelo estava enfurecido. Não tivemos outra opção a não ser chamá-lo.

O pai, após saber do motivo da briga, ordenou que Ângelo ficasse de castigo naquele fim de semana.

O menino passou, sem que a mãe e o pai soubessem, a olhar as revistas de moda que a mãe guardava na sala de costura. Alguns dias depois, Ângelo arrancou uma página da revista e colou em álbum de fotos.

Clara, sempre ocupada com as clientes, não dava muita atenção para o filho. Na escola, Ângelo, depois da briga, fez amizade com um colega de turma, Patrício. Os dois passaram a se ver todos os dias. Para estudar, jogar vídeo game, andar de bicicleta ou simplesmente ver TV.

O ano escolar terminou e Ângelo sempre às voltas com o amigo Patrício.

As famílias se encontraram para os festejos do Natal. Uma convivência que aparentemente começara de forma inocente, pelos filhos, prometia distribuir bons frutos. E assim, ano após ano, reuniam-se em churrascos de aniversários e para os festejos de fim de ano.

Não foi surpresa quando, alguns anos mais tarde, os dois meninos, já adolescentes terminando o segundo grau, anunciaram que fariam vestibular para medicina. Pretendiam ser cirurgiões plásticos. E assim se sucedeu. O que ninguém suspeitava é que iriam cursar faculdade no exterior e morar no mesmo alojamento. Uma luzinha amarela começou a piscar na mente do pai de Ângelo, ou melhor, dele e na mente do pai do Patrício. As mães, envolvidas com suas tarefas caseiras e de profissão, não se envolviam muito com as tarefas da educação dos filhos. Os maridos assumiam inteiramente a tarefa, e demonstravam preocupação mútua, nas conversas presenciais e por telefone.

A preocupação não era sem fundamento. Tanto que, no ano seguinte, no natal, os dois compareceram muito alegres, fluentes no papo, demonstrando estarem muito entrosados. A conversa seguiu normal. Apenas na saída, momentos antes de voltar à faculdade, o pai de Ângelo viu algo que poderia denunciá-los. Viu Ângelo passar a mão no rosto do amigo ao entrarem no carro.

No aniversário de Ângelo os pais resolveram ir visitá-lo.

A terra se abriu aos pés de Pedro e o engoliu. Foi essa a sensação que ele teve ao saber do filho de suas preferências sexuais. Ângelo era gay. A mãe chorando abraçou o filho, enquanto o pai, em ebulição, já vislumbrava as portas do inferno sentindo os efeitos de um enfarto fulminante.

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