Durma bem

Sergio Vinicius Ricciardi

Meia-noite. Lá fora, as folhas do jardim farfalhavam ao vento, refletindo o pálido luar. Uma pequena mãozinha aciona a lâmpada de cabeceira. Um quarto mergulhado na penumbra, surge, com uma estante cheia de bonecas de olhos de vidro que a encaram interrogativamente. A mãozinha então aciona outro botão e espera com o cobertor sob a cabeça.

Ele surge à porta.

- O que foi dessa vez?

- Tem uma coisa ruim no armário.

- Já disse que é sua imaginação.

- Não é nada, eu escutei.

- Preciso dormir. Seja boazinha. Não tem nada no armário.

- Tá bom. Mas se eu chamar, você vem?

- Venho.

- Boa noite.

 - Dorme bem, linda.

O quarto mergulhou na escuridão total outra vez.  Durante um tempo dava somente para ouvir sua respiração acelerada e os batimentos de seu coraçãozinho. E o barulho de algo roçando na grade do armário... Ela senta-se bruscamente na cama, aperta o botão do chamado, acende a luz.
Novamente ele vem, com sono e chateado.

- De novo. Eu te falei que não tem nada no armário.

- Mas eu ouvi, era um barulho fazendo “tec-tec-tec”...

- Não tem barulho nenhum. Volta a dormir. Amanhã eu trabalho e tu tens aula.

- Tá bem... (Chorando).

Silêncio e escuridão de novo. Apenas o vento e a agitação das árvores. De repente a porta do armário começa a se abrir com um ruído: creeec...

Ela dessa vez não aperta o botão. Grita, grita tão alto que em segundos ele aparece em seu quarto. Com pena da sua reação infantil, resolve ser mais amigo e carinhoso dessa vez.

- Querida, queres que eu te mostre como não tem nada aqui?

- Ela, entre prantos, faz que sim com a cabeça.

- Então vamos lá, vou abrir a porta do armário! Um, dois e...

Quando chegou a contar três, virado de frente para o armário aberto, foi atingido em cheio por um grande facão. Sentada na cama, ela pôde ver a ponta da faca subindo pelas costas dele até a nuca. Quando seu corpo caiu sem vida no chão, foi que a criatura mostrou-se completamente, com seu saco a tiracolo, facão pingando sangue e seus dentes pretos e pontiagudos.

Comprimida contra a guarda da cama, ela tentou gritar, mas não emitiu nenhum som.

Nenhum comentário:

Postar um comentário