Preso por crime de prosa

Felipe Basso

Simplesmente não vejo razão
Desta tal de poesia existir
Parece coisa de gente indecisa
Que não sabe se fala ou se canta
E por fazer nem uma cousa nem outra
De azar inventou o poema

Me nego a rimar um só verso!
Não sou homem de falar enfeitado
O negócio é ser reto e direto
Afinal, linguagem não precisa figura
E não é que de só reclamar
Eu também acabei de rimar?

A pior das rimas é aquela encadeada
Dá uma trancada na prosa do povo
Causa até calombo no canto da bocada
Diz a gente mais letrada que é a tal da aliteração
Anacoluto, não sei se não é palavrão
Anáfora é uma confusão. É isso. É aquilo. É cheio de pontuação
Óh ceus! Livrai-me da apóstrofe
Que de catástrofe já me chega a inversão
           
Metáfora, hipérbole, prosopopeia e até sinestesia
Servem só de guia pra dizer nada com nada
E é aqui que a chave do problema se esmiuça
Pois nem que a vaca tussa feito um homem acamado
Eu serei chamado de poeta ou usarei qualquer figura
Essa linguagem um tanto dura que prende o meu palavreado
Preso por um crime já julgado, com sentença apalavrada

Que afeta todo mundo, mas somente eu saio culpado

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